Dos grupos de usuários de droga na Cracolândia de São Paulo ao ator que aparece entre os mais vistos essa semana no Youtube, uma coisa se mostra claramente: a falta de empatia com o dependente químico. A despeito de todos os estudos que demonstram que a dependência química é um problema multifacetado, com aspectos biológicos, psicológicos e sociais, ainda assim, o grosso da sociedade lida com o problema como se fosse uma falha moral, um acontecimento presente apenas na vida de pessoas com caráter questionável.
Há algumas semanas, a prefeitura de São Paulo empreendeu uma ação de “limpeza” na Cracolândia, empenhando um conjunto de ações onde também era prevista a internação compulsória dos dependentes químicos. Assim, julgados em lote, como se o uso de drogas tornasse todos iguais ou semelhante a uma espécie de animal que deveria ser mudado de habitat, a internação nesses moldes não serviria a outro propósito que não o de “higienizar” a cidade.
A lei prevê a internação involuntária quando o paciente não é capaz de responder por si ou coloca em risco terceiros ou sua própria vida. A internação involuntária visa o cuidado e a proteção do paciente, não retirar ele da vista de outras pessoas. A internação compulsória se dá a mando de um juiz, quando o mesmo, ao julgar que esta é necessária para evitar novos conflitos com a lei solicita a perícia de um psiquiatra qualificado. Nem a internação involuntária, nem a compulsória, podem ser feitas indiscriminadamente tendo como único fator determinante o uso de drogas.
O caso da Cracolândia exige uma análise profunda. Entretanto, basta tocar no assunto com algumas pessoas que logo as respostas de praxe começarão a aparecer: “tem que prender”, “tem que matar”, “tem que internar à força”, etc… Um problema de saúde passa a ser discutido de forma bastante simplista como um problema de segurança. Essa “conversa de bar” sobre a dependência química só evidencia o que existe no imaginário da nossa sociedade a respeito do usuário de drogas. Mesmo aqueles que fazem uso recreativo das mesmas, do café à cocaína, tem internalizada a crença de que o dependente químico é alguém fraco e de má índole. Embora as questões sociais sejam de extrema relevância ao se pensar a toxicomania, a falta de empatia está presente também quando um ator, cantor ou personalidade pública aparece sob efeito de alguma substância. Muitas questões são levantadas, mas a temática principal é o julgamento moral e o questionamento sobre o caráter da pessoa, como se o usuário fosse alguém inferior, como se os erros dele fossem erros exclusivamente de usuários e não erros aos quais todos estamos sujeitos.
Não importa que a psicologia e a neurociência digam que os mecanismos que nos mantém presos ao celular sejam os mesmos que nos mantém presos ao uso de drogas, ainda separaremos “eles” de “nós” e isso facilita a desumanização da pessoa. Dá a falsa sensação de que nós, com nossas famílias, empregos e saúde, somos imunes às armadilhas que o uso de drogas cria.
O problema das drogas se distancia cada vez mais da solução quando o encaramos de forma crítica e rasa. A despeito do que as soluções mágicas sugerem, o caminho da mudança está mais perto das práticas de cuidado, atenção e amor do que de medidas truculentas e total falta de empatia.
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