Por que a sobriedade pode gerar crises nos relacionamentos?

Em um primeiro momento essa pergunta pode causar bastante estranheza, visto que, na perspectiva mais comum, o processo de abstinência tende a gerar também melhorias significativas nos relacionamentos daqueles que se esforçam para ficar “limpos”. E isso também é verdade. Porém, há relacionamentos específicos que podem sofrer duros impactos no período em que o usuário para de usar drogas.

Em outros textos já abordamos a questão das funções que o comportamento de se drogar pode ter. Neste, entraremos mais especificamente em uma função que a droga pode ter de equilibrar um relacionamento.

Relacionamentos íntimos são complexas interações que envolvem, por diversas vezes, disputas de poder e controle. As relações podem se estabilizar e equilibrar, não necessariamente de uma maneira saudável, com um dos membros consumindo drogas de maneira problemática. Assim, mesmo produzindo consequências complicadas, o uso de droga pode assumir a função de manter uma relação “em ordem”.

Algumas relações amorosas que se iniciam com uma das partes exibindo um padrão problemático de consumo de drogas podem se estabelecer graças à passividade com que o usuário se posiciona diante de questões delicadas do casal. Em diversos momentos o adicto pode se posicionar de maneira passiva e submissa no relacionamento, aceitando mais o controle da(o) parceira(o), partindo da premissa que ele já está errado “de cara” por ser um usuário. Quando passa a ficar sóbrio, o indivíduo experimenta diversas mudanças, dentre elas está o seu jeito de lidar e se posicionar no mundo. Ele pode passar a não aceitar tanto mais o controle e se posicionar de maneira mais ativa diante do relacionamento, quebrando o equilíbrio e gerando problemas graves na relação.

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Outro contexto no qual observamos a associação entre abstinência e crise de relacionamento são nas relações entre pais e filhos. Durante o período de adicção do filho, os pais podem ter se ocupado tão intensamente dos cuidados e controle do comportamento deste, que na ausência do problema podem encontrar certa dificuldade em se adaptarem ao novo contexto. Até certo ponto, a ansiedade dos familiares relacionada a abstinência recente e ao ganho de autonomia do filho é normal. No entanto, há casos em que ela pode se mostrar persistente e prejudicial, uma vez que o comportamento de monitoria, cuidado e vigilância não se adapta em face ao novo padrão de comportamento do usuário. Essa inflexibilidade e desadaptação pode atrapalhar o desenvolvimento do filho e reforçar a interdependência. São previstos, então, conflitos importantes na medida em que a abstinência se segue de uma maior independência e autonomia.

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Especificidades de alguns relacionamentos podem prejudicar o processo de abstinência. Terapeuta e cliente devem estar cientes e prestarem atenção a quando e como tais padrões de relacionamento podem estar prejudicando. No entanto, se o processo de abstinência gerar afastamento em algumas relações, isso não deve ser visto necessariamente como ruim ou prejudicial. Pode ser apenas um problema antigo que agora não está mais “debaixo dos panos” ou vir a ser também apenas um espaço de reorganização de novas formas de equilíbrio e arranjos mais saudáveis para o relacionamento e para a vida do sujeito.

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